Cena de Tempos Modernos.
No filme “Tempos Modernos” de 1936 do ator e diretor inglês Charles
Chaplin, em seus primeiros minutos, estabelece-se uma síntese da modernidade e
o seu principal signo: o relógio (assista ao filme na integra: https://www.youtube.com/watch?v=0gY0JR6s38g
). O filme começa como a imagem de um relógio tendo como som ao fundo, uma
sirene. Ambos indicam o início ação (sequência que se repetirá ao longo do
filme). É o tempo mecânico, fragmentado. Na sequência desta cena, ovelhas
transitam em um pequeno corredor. Essa imagem tem uma sobreposição de um
conjunto de pessoas (que tal qual as ovelhas) sobem dos túneis do metro
alienadas e passivas para os corredores de acesso a linha de produção.
O tema do filme é direto, a escravidão humana diante das máquinas, ou
melhor, da modernidade. Mas quem é esse escravo? Como essa escravização se dá?
São as respostas que Chaplin vai construindo ao longo dos oitenta sete minutos
do filme. Essas indagações não são novidades na Arte e na Literatura (como já
vimos nos estudos sobre o Realismo e seus desdobramentos nos séculos XIX e XX),
mas ganham no século XX, um espaço cada vez maior para discussão tanto nas
artes plásticas, quanto no Teatro e no Cinema.
Rivoli Theater, Nova Iorque, Estados Unidos
O século XX, é um período de consolidação de uma série de conquistas
tecnológicas eu impulsionaram o estilo
de vida de parte da sociedade, o progresso industrial, mas em contrapartida,
absorveu significativamente uma grande parcela da sociedade europeia em suas
miseráveis linhas de produção (e é disso que o filme Tempos Modernos trata).
Isso acentuou as diferenças entre a alta burguesia e o proletariado, tensão
esta vista pelas lutas sindicais que passam a interferir incisivamente neste
modelo de sociedade industrializada. No cenário político, conturbações como a
Primeira Guerra Mundial, a Revolução Russa e o surgimento do fascismo na Itália
e do nazismo na Alemanha assolaram as primeiras décadas do século XX. O que se
pode concluir desta pequena introdução, é que a Europa deste período vive um
paradoxo classificado como modernidade. E a arte como produto de seu tempo não
poderia ser diferente, desde segunda metade do século XIX já vinha manifestando
em suas composições, o olhar dos homens deste período. E é isso que são os
artistas, homens presos ao seu período histórico, que o leem a partir de suas
subjetividades. E a arte do inicio do século XX, reflete bem essa definição.
O que são as vanguardas?
Edvard Munch, Puberdade 1895; Óleo sobre tela, 150 x 110 cm;
Nasjonalgalleriet
(National Gallery), Oslo
Em arte é uma ilusão acharmos que um
período que se estabelece corresponde a uma evolução, ou uma substituição do
período anterior. A arte que irá se estabelecer no século XX não é uma evolução
da arte do século XIX, mas sim a manifestação concreta de rupturas
(ideológicas, espirituais e culturais) dos valores sociais, culturais e
estéticos predominantes no século XIX. Segundo Mario Micheli (1991), o século
XIX europeu conheceu uma tendência revolucionária em torno da qual se
organizaram o pensamento filosófico, literário, a produção artística e a ação
dos intelectuais (em arte poderíamos pensar o Realismo e seu engajamento e o
impressionismo e a sua transformação na concepção da pintura e na relação com a
cor).
Outro aspecto relevante para a
compreensão das vanguardas, está no que Micheli chama de “decadentismo”, ou
seja, grande parte dos artistas de vanguarda, sentem-se incomodados com a
situação cultural e social dada, o que os leva a abandonar a sua classe social
de origem. Tal ação os colocava confortavelmente em confronto com os valores
sociais de época, ou melhor, com a moral burguesa. É um impulso revolucionário
que os coloca em oposição a ordem vigente, isso fica evidente na passagem
abaixo:
Nesses
artistas, portanto, os mitos do selvagem e do primitivo fazem parte de uma
busca insistente para encontrar a si mesmo a sua felicidade, a sua natureza de
homens, longe da hipocrisia, das convenções, das corrupções. Houve época em
que, no fervor de uma história revolucionária, havia sido possível esperar a
changer la vie. (...) agora, desfeitas aquelas esperanças, era preciso
encontrar em outra parte uma condição que não fora possível criar dentro das
fronteiras da Europa. Nessa situação até mesmo o mais angustiado grito de
Rimbaud encontra explicação: “A verdadeira vida está ausente. Nós não estamos
no mundo”. E quando essa operação também resultar vã, só restará tentar outros
caminhos e procurar a liberdade no sonho ou no silêncio do próprio eu ou em
situações metafisicas. (MICLHELI, 1991, p. 45)
Soma-se ao decadentismo, o
primitivismo e o negrismo presentes nas ideologias estéticas dos movimentos de
vanguarda. Tanto o primitivismo quanto o negrismo correspondiam a uma busca
pelo exótico, pelo diferente. Esse posicionamento não era meramente
especulativo, mas politico, ideológico. Era uma repulsa a cultura europeia
ocidental que chegava a negar a herança figurativista que historicamente
constituiu a arte ocidental. Era a busca
de um estado de pureza da arte (devemos lembrar o contexto histórico
destes artistas: o colonialismo, o inchaço dos centros urbanos, a industrialização
e a precariedade nas condições de trabalho e o período de fortes conflitos
armados entre nações), a procura por uma linguagem fora da tradição europeia.
Pablo Picasso, Les
Demoiselles d”Avignon, 1907.
O exemplo desta pesquisa formal na
arte primitiva e negra é a tela Les Demoiselles
d’ Avignon (1907) do pintor espanhol Pablo Picasso, na qual o pintor deixa
transparecer nas figuras a influência do geometrismo estilizado da arte
africana em seus personagens. Considerada uma ruptura na pintura ocidental do
século XX, Les Demoiselles d’Avignon, causou já em sua primeira aparição um
grande furor no mundo da arte, visto as rupturas (com a perspectiva linear e o
conceito de representação) e as influências presentes em sua composição (arte
da Oceania e arte tribal africana)[2]. A
pintura em si, levou nove meses para ser concluída, Picasso elaborou centenas
de esboços e estudos em sua preparação. Sobre as influências do quadro, residem
as maiores controvérsias, pois o artista reconhece a importância da arte
espanhola e da escultura ibérica na composição negando a influência da arte
tribal africana no trabalho. Todavia, essa influência é evidente, e quase um
consenso entre seus críticos. Pois Picasso havia visitado na primavera de 1907 o Musee d’Ethinographie du Trocadero,
tendo contato com a exposição de arte tribal africana, meses antes de concluir
a pintura.
Sala Oceania, Musee d’Ethinographie du Trocadero (Hoje
Museu do Homem), Paris, 1895.
Fonte: http://les-sources-du-nil.tumblr.com/post/45179038391/oceanic-room-musee-dethnographie-du-trocadero
É nesse contexto complexo do
início de século, que surgem os movimentos artísticos que receberam na história
da arte a denominação de vanguardas artísticas; são eles: o expressionismo, o cubismo, o fauvismo, o
abstracionismo, o futurismo, o dadaísmo e o surrealismo. Movimentos que
expressavam uma nova leitura da realidade e, consequentemente da forma
artística até então compreendida pelo homem.
O expressionismo
Como apresentado na introdução deste
texto, o entrar no século XX foi um período de contradições sociais profundas
na Europa. A ilusão de progresso e modernidade, que gerou em um setor da
sociedade uma sensação de bem estar e
felicidade, era a marca do entusiasmo burguês em sua fase de prepotente
desenvolvimento econômico. Mas será que essa sensação de bem estar afetava a
todos?
Pelo o que vimos até aqui, a
resposta é obvia: NÃO.
Dimensões: 765 x 845 mm Moldura: 912 x
950 x 64 milímetros
O Expressionismo, primeiro dos movimentos de vanguarda que eclodiram na
Europa deste período, se vê tomado por artistas que não compartilhavam dessa
visão otimista de mundo. Muitos destes jovens artistas (e outros já mais
experientes) estavam influenciados pelo pensamento do filósofo alemão Friedrich
Nietzsche (1844-1900), no qual as certezas morais das tradições, o homem como
um ser inacabado e angustiado, acabaram por colocar em xeque o bem estar
burguês (o decadentismo pregava o abandono desta visão de mundo) e penetrar em
suas obras (sobre sua filosofia, assista ao vídeo produzido pela BBC: “Humano,
Demasiado Humano” – no link: https://www.youtube.com/watch?v=TznwyQRHDwE ).
Tal influência filosófica, viabilizou também a organização destes artistas em
grupo, como o caso do Die Brücke, em Dresden (1905). Deste grupo faziam parte Ernst Ludwig Kirchner,
Erich Heckel e Karl Scmitdt-Rottluff.
Dimensões: 606 x 864 mm Moldura: 761 x
1026 x 86 milímetros
O
expressionismo é um movimento de protesto. É antipositivista, antinaturalista e
antiimpressionista. Essa posição “anti” da arte expressionista pode ser facilmente compreendida por suas buscas,
enquanto que para o naturalismo e impressionismo, a realidade era algo a ser
observado e pintado, para os artistas expressionistas o que se buscava era
expressar as emoções humanas e interpretar as angústias que caracterizavam
psicologicamente o homem do início do século XX. Experiência pictórica que já
havia sendo desenvolvida com pintores como Vincent Van Gogh[5]
(sobre Van Gogh, assista ao filme: “Van Gogh – vida e obra de um gênio” no
Link: https://www.youtube.com/watch?v=35mkBpAwnAw
) e Edvard Munch, que procuravam através da organização das cores revelar o
mundo interior dos seres representados.
Edvard Munch, O Grito, 1893, óleo sobre tela.
A deformação dos corpos, o uso de cores que são referenciadas pela
condição psicológica destes artistas, a busca por temas que tratam da
existência humana, a valorização da linha, do empastelamento da tinta e o
gestual, são as marcas deste movimento plástico que se estendeu para o Teatro e
Cinema (temas que debateremos em outro momento).
Envolvidos em grupos ou isoladamente, artistas entre as décadas finais do
século XIX e início do século XX, manifestavam a sua condição existente em suas
telas. Isso mesmo, condição existente. De todos esses artistas, talvez, o que
melhor expresse a definição expressionismo, seja o pintor norueguês Edvard
Munch. Sua pintura mais famosa é “O Grito” (1893) [6]. Nesta pintura, um ser angustiado manifesta em
um grito gutural o seu sofrimento, como pode-se ler nas linhas do próprio
pintor sobre a produção deste trabalho:
o céu ficou de súbito vermelho-sangue.
Eu parei, exausto, e inclinei-me sobre a vedação.
Havia sangue e línguas de fogo
sobre o azul-escuro do fiorde e sobre a cidade.
Os meus amigos continuaram,
mas eu fiquei ali a tremer de ansiedade
e senti o grito infinito da Natureza.”.
Edvard Munch[7]
Enquanto isso na França...
Em outubro de
1903, depois de receber a notícia da morte de Gauguin[8],
Maurice Denis publicou na Revista Occident um artigo sob o título “L’influence
de Paul Gauguin”. Entre outras coisas ele escrevia nesse artigo: “O nome de
Gauguin nos foi revelado no início de 1888 por Sérusier, um do grupo de Le
Pouldu, que voltando de Pont-Aven, nos mostrou não sem algum mistério, a tampa
de uma caixa de charutos na qual via-se uma paisagem disforme, por ter sido
sinteticamente formulada em roxo, vermelhão, verde-veronês e outras cores
puras, da forma como saem do tubo, sem mistura com o branco: Como veem essa
árvore? Dissera Gauguin diante de um
canto do bosque d’Amour. Verde? Então coloquem um pouco de verde, o mais belo
verde que tiverem na paleta. E essa sombra? Um tanto azul? Não tenham receio de
pintá-la com o azul mais intenso possível...’ Assim descobrimos que toda obra é
uma transposição, uma caricatura, o equivalente apaixonado de uma sensação
recebida... Eles nos libertava de todo e qualquer embaraço que a ideia de
copiar trazia a nossos instintos de pintores... Se era permitido pintar com o
vermelhão aquela árvore que, naquele instante, se mostrara aos nossos olhos de
um vermelho vivo, porque não traduzir, exagerando-as, as impressões que
justificam as metáforas dos poetas; afirmar até a deformação a curva de um belo
ombro, intensificar a candura perolada de uma pele., enrijecer uma geometria de
galhos não agitados pelo vento?..” (MICHELE, 1991, pp. 62-63)
Estavam dadas as bases do fauvismo. Tendência pictórica que surge pela
primeira vez em 1905, em Paris, durante a realização do Salão de Outono,
exposição na qual alguns jovens pintores foram chamados pelo crítico Louis Vauxcelles de fauves (feras), por causa da
intensidade com que usavam as cores puras, sem misturá-las. Estavam dadas, ou
melhor materializadas as influências primitivistas de Paul Gauguin na arte
moderna. A cor bruta, a forma simplificada, tendendo a uma geometrização das
figuras.
A realidade neste momento, tornou-se secundária, ou seja, a pintura
passou a ser debatida nas telas destes pintores fauvistas como tinta-cor sobre
suporte, a forma um sensação traduzida pela subjetividade do artista. Logo
pode-se dizer que dois princípios regeram esse movimento artístico: a
simplificação das formas das figuras e o emprego das cores puras. Por isso, as
figuras fauvistas são apenas sugeridas e não representadas realisticamente pelo
pintor. Da mesma forma, as cores não são as da realidade observada. Fizeram
parte deste movimento: André Derain, Maurice de Vlaminck, Othon Friesz e Henri
Matisse.
Reclining
Odalisque (Harmony in Red), 1927
Henri Matisse (French, 1869–1954)
Oil on canvas; 15 1/8 x 21 5/8 in. (38.4 x 55 cm)
Henri Matisse (French, 1869–1954)
Oil on canvas; 15 1/8 x 21 5/8 in. (38.4 x 55 cm)
O cubismo
Georges Braque, Mandora, 1909-10, óleo sobre tela.
Dimensões 71,1 x55,9 cm
Historicamente o cubismo se originou na pintura de Paul Cézanne (pintor
do século XIX que transitou entre os impressionista, cuja a obra se caracteriza
pelo estudo da forma), para quem a pintura deveria tratar as formas da natureza
como se fossem cones, esferas e cilindros (sobre a proposta plástica deste
pintor, assista ao documentário: “Os impressionistas – Paul Cézanne” nos links:
https://www.youtube.com/watch?v=iJfcABWWYp4 e https://www.youtube.com/watch?v=s2K16-ZU3DI ).
Paul Cézanne, Vista de Gardanne,1885-1886.
fonte: http://www.artehistoria.jcyl.es/v2/obras/6080.htm
O cubismo desdobrou esta teoria de Cézanne, a representação de seus
objetos passaram a levar em consideração todas as partes do mesmo em único
plano, como se este objeto estivesse aberto, representava-se o objeto sem
nenhum compromisso de fidelidade com a aparência real deste. Decreta-se com o
cubismo, o fim da busca da ilusão espacial criada pela perspectiva
renascentista. Nas imagens acima, fica evidente essa transformação nas
pesquisas da forma. Enquanto que na pintura de Cézanne (Vista de Gardanne)
percebe-se a ênfase na geometria dos telhados em paredes das residências, que
constroem uma perspectiva livre pautada nos volumes dos corpos, na pintura de
Braque (Mandora), o que predomina são os sólidos, a geometrização do corpo. A
abstração quase total da referência visual.
O cubismo enquanto tendência plástica se dividiu em duas correntes
chamadas de Cubismo Analítico e Cubismo Sintético. O Cubismo Analítico
foi desenvolvido por Pablo Picasso e Georges Braque, entre 1908 e 1911.
Trabalhavam com poucas cores (preto, tons de cinza, marrom e ocre), tendo por
objetivo principal a fragmentação total da forma (a pintura de Braque logo
acima é um exemplo clássico deste fase cubista).
Pablo Picasso (1881-1973), Garrafa de Vieux Marc, Vidro, Guitarra e Jornal
Guitare,
jornal, verre et bouteille, 1913Jornais impressos e tinta no
papelDimensões: 467 x 625 milímetros
Fonte: http://www.tate.org.uk/art/artworks/picasso-bottle-of-vieux-marc-glass-guitar-and-newspaper-t00414
O Cubismo Sintético, foi uma reação destes pintores a sua proposta
anterior, procurando tornar as formas outra vez reconhecível em suas pinturas.
O Cubismo Sintético foi também chamado de Colagem por introduzir letras,
palavras, números, pedaços de madeira, vidro metal e até objetos inteiros em
suas pinturas. Também fez parte do
movimento cubista o pintor francês Fernand Léger.
O abstracionismo
A principal característica da arte
abstrata é a ausência de relação imediata entre as suas formas e cores e as
formas e as cores de um ser. Atribui-se ao pintor russo Wassily Kandinsky o título
de iniciador dessa tendência com suas
pinturas abstratas , sendo o seu primeiro trabalho nesta linha o quadro
“Batalha”.
Kandinsky, Wassily.
Batalha. 1910. Londres,
Tale Gallery
Em 1914, Kandinsky entrou em contato com os pintores russos Mikhail
Larionov e Natalia Gontcharova que valorizavam as relações entre as cores sem
se preocupar com a representação de um assunto.
Natalia Goncharova, Raionismo, Blue-Green Forest, 1913, Óleo sobre tela. Fonte: http://www.moma.org/
Outro grande nome do abstracionismo foi o também artista plástico russo
Vladimir Tatlin, que sob influência cubista, passou a desenvolver em sua
poética o trabalho com o vidro, metal e madeira, suas obras completamente
abstratas são a base do movimento Construtivista.
O abstracionismo como um gênero de representação pode ser dividido em
dois estilos: o abstracionismo informal, cujos sentimentos e emoções são predominantes,
e tem em o Kandinsky seu principal representante. E o abstracionismo
geométrico, em que formas e cores são organizadas no intuito de compor um
arranjo geométrico, o seu principal expoente é o pintor holandês Piet Mondrian.
Segundo Alain Bonfand (1996),
os iniciadores da arte abstrata foram Wassily Kandisnsky[9],
Paul Klee[10],
Malevitch e Piet Mondrian. Estes artistas trazem para a arte uma discussão
extremamente contemporânea para os dias atuais: o problema do suporte. À medida
que suas pinturas estabelecem o fim da pintura de cavalete, ao colocarem que a
arte é mais que uma mera representação do mundo, mas sim uma ideia sobre
este. Nesta perspectiva, a ideia
artística supera os limites físicos do quadro, possibilitando experiências com
materiais de natureza diversa (vidro, ferro, concreto, madeira, acrílico).
Tatlin, Vladimir, Canto
Counter-relevo (1914-1915).
Na composição plástica destes artistas abstracionistas, elementos como
ritmo visual que é medido através da distribuição das formas e cores no plano
visual, o equilíbrio (relação entre forma e espaço) transforma-se no problema
central desta nova estética. O abstracionismo se caracteriza por ser uma
tendência internacional, cujos problemas da forma são levados ao extremo da
racionalidade.
O futurismo
O Futurismo como vertente modernista da arte, foi introduzido
por Filippo Marinetti, em 1909 com o seu “Manifesto Futurista[11]”.
A principal característica desse manifesto era exaltação da velocidade, energia
e da força. O manifesto trazia uma fortíssima crença no progresso
científico-tecnológico, anunciando uma nova concepção estética, simbolizada por
exemplo, no automóvel, projetando-se no futuro.
Carlo
Carrà (italiano,
1881-1966), Choques de um táxi, 1911Óleo sobre tela, Dimensões: 52,3 x 67,1 centímetros. Fonte: http://www.moma.org/collection/browse_results.php?criteria=O:AD:E:987&page_number=2&template_id=1&sort_order=1
Destaca-se nesse manifesto algumas passagens que tornarão
mais compreensível essa crença na máquina.
Publicado em 20 de fevereiro de 1909, no jornal Le Fígaro, o manifesto em seu primeiro
item anunciava a crença na energia (1. Nós queremos cantar o amor ao
perigo, o hábito da energia e da temeridade.) que metaforicamente refere-se a
força que move o progresso, o dinamismo. Essa ideia é reiterada já no segundo
item, ao referir-se a ideia de rebelião, a insurreição de uma nova estética, ou
comportamento estético que rompesse com a tradição (2. A coragem, a audácia, a
rebelião serão elementos essenciais de nossa poesia).
É
explícita a ênfase na velocidade produzida pela máquina, veja no quarto item:
4. Nós
afirmamos que a magnificência do mundo se enriqueceu de uma beleza nova: a beleza da
velocidade. Um automóvel de corrida
com o seu cofre enfeitado com tubos grossos, semelhantes a serpentes de hálito
explosivo… um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais
bonito que a Vitória de Samotrácia.
É o homem moderno, e o estilo de vida do homem moderno,
urbano e tecnologicamente desenvolvido que é exaltado (lembrem-se nesse período
a eletricidade, os motores a combustão de fosseis, o cinema e a fotografia, a
metralhadora e outras novas tecnologias já representavam um mundo dinâmico, ou
muito mais dinâmico do que já fora visto). O manifesto é uma negação a tudo
aquilo que Marinetti considerava retrogrado, e em seus termos, estático.
A dinamicidade trazia no cerne do manifesto a idéia de
renovação constante, de uma arte de ruptura.
9. Queremos
glorificar a guerra – única higiene do mundo –, o militarismo, o patriotismo, o
gesto destruidor dos libertários, as belas ideias pelas quais se morre e o
desprezo pela mulher.
10. Queremos
destruir os museus, as bibliotecas, as academias de toda a natureza, e combater
o moralismo, o feminismo e toda a vileza oportunista e utilitária.
Nos itens acima percebe-se claramente a proximidade que o
pensamento futurista de Marinetti mantinha com o fascismo na Itália
(encontrando também na França artistas que compartilhassem desses ideais
fascistas). Além, do repúdio a tradição, representada no item 10 pelos museus e
bibliotecas.
É de se notar que o pensamento de Marinetti que inicialmente
se voltou à literatura, encontrou dentro da arte italiana do período espaços
para penetrar em outras linguagens. O manifesto de 1909 foi o primeiro de
muitos, todos publicados entre os anos de 1909 e 1916. A decadência de
movimento se deu após a I Guerra Mundial, mas como todo movimento cultural,
deixou ecos, e sua principal herança foi o caráter ruidoso e inquieto que se
manifestará claramente na arte dadá.
Suas características nas artes plásticas estão diretamente
relacionadas com a tentativa de refletir o ritmo e o espírito da sociedade
industrial.
Para
expressar a velocidade os artistas futuristas recorriam a repetição dos traços
das figuras.
O
datilógrafo. Anton Giulio Bragaglia (Italiano,
1890-1960). Data: 1911, Médio: Gelatina de impressão de prata. Dimensões: Imagem: 11,9 x 16,7 cm (4 11/16 x 6 9/16 pol) Folha: 12,8 x 17,8
cm (5 1/16 x 7 polegadas). Fonte: http://www.metmuseum.org/collection/the-collection-online/search/286592
Nos trabalhos fotográficos de Anton Giulio Bragaglia (1890 – 1960), procura-se o movimento, ou seja,
o corpo em deslocamento dentro do registro da imagem[12]. Em
suas reflexões em “A fotodinâmica futurista” Bragaglia afirma que:
Logo que sentimos a beleza do movimento, eu
e meu irmão Arturo, que possuíamos de maneira suficiente a ciência fotográfica,
reconhecemos a atitude dos meios mecânicos desta para estudar o movimento e
para criar uma arte futurista, rapidamente fecunda e aderente às necessidades
modernas.
Instituindo, pela mais perfeita
representação do movimento, novos sistemas técnicos que, no decorrer do tempo,
viriam a ser aperfeiçoados, criamos, portanto, aquela que chamamos de
Fotodinâmica, que inicia hoje os primeiros passos em direção ao futuro.
Queremos fotografar a vida nos seus movimentos inumeráveis, enquanto ela se
precipita antes sob a forma humana ou mecânica.
(...)
Enojados pela cadavérica imobilidade das
representações na arte, preferimos fotografar em movimento, mesmo as coisas
paradas, assim como as vemos, na correria dos nossos dias vertiginosos.
Por isso detestamos a fotografia glacial e racionalmente seguimos, na nossa
Fotodinâmica, gestos essencialmente futuristas. (publicado no “Noi
e il Mondo”, 1 de abril de 1913)
Na escultura, os artistas futuristas fazem trabalhos
experimentais com vidro e papel e seu expoente é o pintor e escultor italiano
Umberto Boccioni. Um marco referencial de sua proposta escultórica e a peça
“Formas Únicas na Continuidade do Espaço” (1913), na qual a figura é cortada
por intersecções de volumes distorcidos na tentativa de se criar a ilusão de
movimento e de força.
Dadá e surrealismo
Revista Der Dada
O movimento Dadaísta, surgiu como um movimento literário de artistas,
intelectuais e escritores, exilados em Zurique, que se manifestavam contrários
à participação de seus países na Primeira Guerra Mundial.
O Dadaísmo consistia em um grupo de escritores, poetas e artistas
plásticos – dois deles desertores do
serviço militar alemão – liderados por Tristan Tzara, Hugo Ball e Hans Arp.
Também pertenciam a esse grupo os artistas Marcel Janko e Hans Richter. Hugo Ball fundou em Zurique o Cabaret
Voltaire em 1916, que se tornaria a sede do primeiro grupo dadaísta,
o clube seria destinado às manifestações artísticas de vanguarda.
Neste cabaret,
desenvolveram uma série de atividades que rapidamente ganhou notoriedade devido
o seu caráter provocativo – a coisa toda alcançou
Paris, NY, Berlim e vários outros lugares. Suas propostas experimentais
voltavam-se para experiências estéticas pautadas no acaso, e no absurdo, o que
revelava nas ironias as tendências antirracionalistas do grupo.
Eram comuns no dadaísmo as colagens
autômatas. Em 1919 surge a revista “Der Dada” (O que é Dada?) com uma
função informativa do movimento. Surge com a revista a afirmação da antiarte. O
que promovia um debate sobre a própria instituição do sentido no campo da arte,
assim como as novas possibilidades de vivências estéticas.
O carro chefe do Dadaísmo está centrado na obra de Marcel Duchamp,
especificamente, os seus ready made.
O termo ready made refere-se aquilo pronto, ou seja, objetos que o
artista toma posse e o resignifica dando-lhe o estatuto de objeto de arte.
Fontaine Replica of Marcel
Duchamp.
Musee Maillol, Paris, France.
(1917)
Deve-se
ressaltar que o objeto (ready made) não
é produzido pelo artista, e sim apropriado e é o artista quem o classifica como
sendo objeto de arte ou não. Isso era uma resposta clara à instituição
Arte, com os seus salões, ateliês, curadores e Liceus. O gesto de Duchamp foi
uma crítica à arte a partir do próprio trabalho de arte. Observe o exemplo
acima. Como uma peça de louça de banheiro pode ser considerada um objeto de
arte?
O que Duchamp fez para transformar um urinol em objeto de arte, retira-lo
de seu plano funcional (louça de banheiro masculino) para o simbólico
(atribuindo-lhe o titulo de “A fonte” e o enviando ao salão para ser julgado
não como uma loca de banheiro, mas sim, como um objeto de arte).
Note como A fonte (o urinol) se transformou em objeto de arte:
Em 1917 foi
fundada em Nova Iorque
a nova sociedade a nova Society for Independent Artists […] Qualquer pessoa que
pagasse seis dólares podia apresentar dois trabalhos. Duchamp era um dos
diretores do grupo, mas como ele não gostava da organização, decidiu provocar
os responsáveis pela escolha e exibição dos objetos, ao apresentar a Fonte
sob pseudônimo.
A Fonte era um
urinol de porcelana de um modelo que, quando montado numa casa de banho público
(banheiro), só poderia ser usada para um homem urinar de pé. (...) Duchamp
limitou-se a comprar o urinol (...). Assinou a base, logo a seguir o buraco do
cano: R Mutt.
A Fonte nunca
foi exposta (...) apesar de R. Mutt ter pago seis dólares a peça nem sequer foi
mencionada no catálogo.(MINK, 2000: p. 63-67)
Os ready-made foram criados não para serem julgados se são belos ou
feios, mas para fazer o espectador
refletir sobre o que vê. Não é pertinente aqui discutir sobre sua beleza ou
feiúra, porque não são obras, mas signos (ou objetos-signos) de interrogação ou
de negação diante das obras.
Man RayObjeto
indestrutível 1923, refez 1933, réplica editioned 1965
Fonte: http://www.tate.org.uk/art/artworks/man-ray-indestructible-object-t07614
O Dadaísmo propunha que a criação artística se libertasse das amarras da
racionalidade e que fosse apenas o resultado do automatismo psíquico. O
Dadaísmo e sua proposta de automatismo propiciaram o surgimento do Surrealismo,
na França, em 1924, último dos movimentos denominados de vanguardas artísticas europeias.
Encabeçados pelo poeta e escritor André Breton, os artistas surrealistas
assumiram o automatismo psíquico como a base de seu processo criativo, desta
forma a imagem resultante desta relação não têm uma relação direta com a razão,
com a moral e à própria preocupação estética.
A crítica à racionalidade burguesa em favor do maravilhoso, do
fantástico e dos sonhos reúne artistas de feições muito variadas. Na
literatura, além de Breton, Louis Aragon, Philippe Soupault, Georges Bataille,
Michel Leiris, Max Jacob entre outros. Nas artes plásticas, René Magritte,
André Masson, Joán Miró, Max Ernst, Salvador Dalí, e outros. Na fotografia, Man
Ray, Dora Maar, Brasaï. No cinema, Luis Buñuel. Certos temas e imagens são
obsessivamente tratados por eles, com soluções distintas, como, por exemplo, o
sexo e o erotismo; o corpo, suas mutilações e metamorfoses; o manequim e a
boneca; a violência, a dor e a loucura; as civilizações primitivas; e o mundo
da máquina. Esse amplo repertório de temas e imagens encontra-se traduzido nas
obras por procedimentos e métodos pensados como capazes de driblar os controles
conscientes do artista, portanto, responsáveis pela liberação de imagens e
impulsos primitivos. A escrita e a pintura automáticas, fartamente utilizadas,
são formas de transcrição imediata do inconsciente, pela expressão do
"funcionamento real do pensamento" - como, os desenhos produzidos
coletivamente entre 1926 e 1927 por Man Ray, Yves Tanguy, Miró e Max Morise,
com o títuloO Cadáver Requintado). A frottage [fricção] desenvolvida por Ernst faz
parte das técnicas automáticas de produção. Trata-se de esfregar lápis ou
crayon sobre uma superfície áspera ou texturizada para "provocar"
imagens, resultados aleatórios do processo, como a série de desenhos História Natural, realizada
entre 1924 e 1927.
(ITAU-CULTURAL, 2008)
São manifestações do subconsciente, absurdas e ilógicas, como imagens de
sonhos e alucinações.
Referencial bibliográfico
ALLEY, Ronald. Catálogo da Colecção da Tate Gallery of Modern Art diferente Obras de
artistas britânicos, Tate Gallery e Sotheby Parke-Bernet, Londres 1981.
BONFAND, Alain. Arte Abstrata. Campinas, Papirus, 1996.
GOGH, Vincent Van. Cartas a Théo. Tradução: Pierre
Ruprecht. Porto Alegre, LP&M Pocket, 2002.
MINK, Janis. Marcel Duchamp. Tradução:
Zita Moraes. Colônia: Taschen, 2000.
WOOD,
Paul. Arte Conceptual. 1° edição.
Tradução: Maria das Graças Caldeira. Lisboa: Editora Presença, 2002.
FER, B; BATCHELOR, D; WOOD, P. Realismo,
Racionalismo e Surrealismo: a arte no entre-guerras. São Paulo, Cosac & Naify Edições,
1998.
CABANNE, Pierre. Marcel Duchamp : engenheiro do tempo
perdido. São Paulo: Perspectiva, 2001.
MICHELI, Mario. As Vanguardas Artísticas. Tradução:
Pier Luigi Cabra. São Paulo, Martins Fontes, 1991.
[1]
Filme escrito e dirigido por Charles Chaplin. Produção de Patríciu Santans,
Estados Unidos, 1936. Pelicula em preto e branco, 87 minutos de duração. Elenco:
Charles Chaplin, Paulette Goddard, Henry Bergman, Stanley Stanford, Chester
Conklin. Música de CharlesChaplin. Estúdio: United Artists. Lançamento official
do filme em 5 de fevereiro de 1936, no Rivoli Theater, Nova Yorque, Estados
Unidos.
[3] De acordo com Ronald Alley em catálogo da Colecção
da Tate Gallery of Modern Art
(1981, p.671), Karl Scmitdt-Rottluff foi um pintor, gravador,
litogravurista e escultor expressionista alemão, que tinha como tema de suas
pinturas, paisagens e natureza morta. Nascido próximo Chemnitz,
Saxonia. Estudou Arquitetura na Escola Politécnica de Dresden entre
1905-6. Através de sua amizade com Heckel conheceu Kirchner e Bleyl. Esses
quatro artistas fundaram em junho de 1905, o grupo "Die Brücke" (A
Ponte).
[4] Pintor expressionista, desenhista e litógrafo de retratos,
paisagens e temas figura; autor de
várias peças e outros escritos. .Nascido em
Pöchlarn, Áustria, da República Checa e ascendência austríaca. Estudou na Escola de Viena de Artes e Ofícios 1905-9. Suas primeiras pinturas e peças de teatro despertou intenso
antagonismo, mas ele foi ajudado por Adolf Loos, com a ajuda de quem ele
recebeu suas primeiras comissões para retratos; desenhos também contribuiu para o periódico Der Sturmde
Berlim. Primeira exposição individual na Galerie Paul Cassirer,
Berlim, 1910. Movido em 1917 para Dresden
e lecionou na Academia Dresden 1919-1924 (ELLEY, 1981, p. 391).
[5] Para
compreender essa relação de Van Gogh com a sua arte leia:
mais dados biográficos e obras: http://www.vangoghgallery.com/painting/starry-night.html
[6] Para
compreender mais leia o artigo citado: http://obviousmag.org/archives/2012/06/edvard_munch_um_grito_infindavel.html
Assista a animação The scream: https://www.youtube.com/watch?v=qz6gT7S9_XI
Mais trabalhos de Edvard Munch: http://www.moma.org/collection/artist.php?artist_id=4164 ou http://www.ibiblio.org/wm/paint/auth/munch/
[7] Sobre o
trabalho de Edvard Munch leia também: http://ulbra-to.br/encena/2013/01/27/Angustia-e-desespero-existencial-O-Grito-de-Edvard-Munch
Assista ao documentário “Os impressionistas – Paul
Gauguin
[9]
Entrevista com Luiz Roberto Lopredo comentando Kandinsky, assista no link: https://www.youtube.com/watch?v=TZ8BLs2_a_g
[10] Vídeo
Paul Klee – O Diário de um artista, assista no link: https://www.youtube.com/watch?v=tI-mW8mZfjU
Síntese do vídeo: O
programa entra na intimidade do artista plástico Paul Klee por meio das páginas
de seu diário para entender sua relação com a arte. Através de suas histórias
de vida na Alemanha nazista, da vida familiar, da influência de grandes
artistas como Kandinski e movimentos como o expressionismo e o cubismo,
conhecemos um pouco mais o pintor e entendemos como suas ideias, sua
curiosidade e seus métodos o levaram a se tornar um dos maiores pintores do
século XX.
[11]
Fragmento do manifesto Futurista: http://memoriavirtual.net/2005/02/21/futurismo-manifesto-futurista-2/
Exercício de captação fotodinâmica: http://learnmyshot.com/movement-photography-futurist-photodynamism-technique/
O Manifesto do fotodinamismo por Anton Bragaglia: http://www.391.org/manifestos/1913-futurist-photodynamism-anton-giulio-bragaglia.html
[13] Vídeo
expondo todos so ângulos da Forma Única em Continuidade no espaço: